Gatunos do STF admiram a censura chinesa


The Brazilian Supreme Court's decision to regulate social media is criticized for mirroring China's censorship model, raising concerns about freedom of speech.
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“Um pouco na linha ‘nós todos somos admiradores do regime chinês’, né, do Xi Jinping, né, que diz assim: ‘A cor do gato não importa, o importante é que ele cace o rato’, né.” Foi com essas palavras que o ministro Gilmar Mendes, decano (juiz mais antigo) do Supremo Tribunal Federal (STF), sacramentou a “regulamentação” das redes sociais no Brasil, aprovada até agora por uma maioria de 6 a 1. E, de fato, a “cor do gato" – ou seja, a entidade responsável pela regulamentação ou seu modelo – pouco importa. O que realmente interessa é que o gato “cace o rato”, isto é, que se alcance o ideal chinês, tão admirado pelo Supremo, de regulação e controle das redes sociais. Só que… o modelo chinês é responsável por uma censura de cidadãos draconiana e em massa.

Quem diria que o homem de confiança de Xi Jinping – que Lula pediu que viesse ao Brasil para ajudar na regulamentação das redes sociais – era, na verdade, ninguém mais, ninguém menos do que Gilmar Mendes. Alguém realmente ficou surpreso? A internet celebrou a revelação do enviado chinês com a sua especialidade, os memes, caracterizando Gilmar com a vestimenta dos líderes chineses.

É isso que o STF acabou de instaurar no Brasil: um clima de medo que fará as plataformas censurarem conteúdos legítimos e protegidos pela liberdade de expressão por receio de pesadas multas. Sem direito à apelação

Com as suas palavras, originalmente ditas por outro comandante da ditadura comunista, Deng Xiaoping, Gilmar apenas escancarou algo que os ministros já nem se preocupam mais em esconder: não se trata de coibir discurso de ódio, salvar a democracia ou proteger criancinhas indefesas na internet, mas sim de censurar críticos e dissidentes políticos que ameaçam a hegemonia de grupos de poder. É a mesma justificativa usada na China para impor censura: proteger a tal “harmonia social”.

E como é esse regime chinês, tão admirado por Gilmar e por outros ministros do STF? Trata-se simplesmente da maior máquina de censura online do mundo, conhecida como o “Grande Firewall”. Por meio dele, o regime controla o fluxo de informações na internet, filtra o que pode ou não ser postado, proíbe acesso a sites indesejados – como portais de notícias e redes sociais ocidentais – e bane conteúdos que contenham palavras-chave específicas.

Esse sistema conta com o apoio de uma inteligência artificial monstruosa, treinada para identificar, localizar e banir conteúdos com base em mais de 130 mil termos e expressões considerados hostis à “harmonia social”. Um provérbio tradicional chinês, “Quando a árvore cai, os macacos se espalham”, é proibido, pois pode ser interpretado como referência à queda do Partido Comunista Chinês. É esse o sistema que o STF de Gilmar admira, com exceção honrosa do ministro André Mendonça, o único voto até agora contra o autoritarismo.

E como tudo que é ruim pode piorar, o regime idolatrado pelos ministros do STF também adota um sistema de pontuação social: os cidadãos são classificados com base em sua conduta pública. Pessoas consideradas “más cidadãs” – como aquelas que criticam o governo chinês no ambiente online – perdem pontos e podem ser impedidas de viajar, de matricular os filhos em boas escolas ou de conseguir bons empregos.

E, sim, fica ainda pior: a sua pontuação social pode afetar até sua família, que pode ser punida mesmo que não concorde com suas ações ou sequer tenha relação com você. Qualquer semelhança com o ministro Alexandre de Moraes bloqueando os perfis nas redes sociais do filho e da mãe da deputada Carla Zambelli não é mera coincidência – é método. Trata-se da aplicação fiel dos métodos chineses admirados pelos ministros do STF.

Se esse relato macabro te lembrou da série distópica Black Mirror, da Netflix, também não é por acaso: o episódio Nosedive (Queda Livre) retrata de forma assustadora como a vida humana se degrada quando os cidadãos entregam suas liberdades individuais a sistemas autoritários. Se um dia você quiser garantir pesadelos perturbadores, basta assistir a esse episódio antes de dormir.

Agora, com a maioria de 6 a 1 pela regulamentação das redes, os ministros do STF entregaram a sua liberdade – a do povo brasileiro – nas mãos das plataformas: são elas que decidirão se o que você publica é lícito ou ilícito. O Supremo criou um poderoso tribunal privado cujos algoritmos determinarão se o que você diz configura discurso de ódio, desinformação, apologia ou incitação ao crime, racismo, machismo e misoginia, homotransfobia, incentivo à pedofilia, à automutilação ou ao suicídio ou então discurso antidemocráticos.

Como essas empresas não têm condições reais de avaliar contexto e conteúdo com a devida precisão, a solução será configurar os algoritmos para derrubar automaticamente tudo que contenha certas palavras-chave ou, talvez, definir quem são “pessoas perigosas”, numa nova versão do “racial targeting” ou “racial profiling”, agora direcionado para crenças e visões de mundo. Exatamente como no regime chinês. O resultado será a censura prévia em massa de cidadãos brasileiros, que serão amordaçados sem pena pelo Grande Firewall do STF.

Um estudo da universidade americana Vanderbilt mostrou o que aconteceu depois que a regulamentação das redes impôs obrigações e multas às plataformas de redes sociais na Alemanha, França e Suécia. O resultado foi um espanto: entre 87,5% e 99,7% dos conteúdos removidos eram legais - o percentual variou nessa faixa nos diferentes países e redes sociais. Sim, é isso mesmo que você leu: a moderação se tornou tão agressiva que as empresas apagaram conteúdos legítimos em massa, por precaução, já que a regulamentação previa multas milionárias em caso de descumprimento. Consegue adivinhar qual era o conteúdo apagado?

O estudo fez comentários reais em redes sociais nos três países e depois chamou juristas e especialistas de cada lugar para avaliar o que foi apagado: críticas a políticas de imigração, apoio a candidatos e ideias conservadoras, comentários religiosos e opiniões sobre vacinas. Podiam ser comentários críticos, polêmicos, mas eram legais e legítimos. Escorreu tudo pela vala comum da censura, e as plataformas sequer informaram a razão da remoção - apenas indicavam "violação das diretrizes". Sem transparência, sem chance real de apelação.

É isso que o STF acabou de instaurar no Brasil: um clima de medo que fará as plataformas censurarem conteúdos legítimos e protegidos pela liberdade de expressão por receio de pesadas multas. Sem direito à apelação. A gataria está solta, e o gato verde-amarelo acabou de se unir ao gato vermelho. Os ratos que se cuidem: sejam eles as redes sociais, a liberdade de expressão ou mesmo você. Os gatunos já demonstraram que têm um apetite voraz e uma boca grande, sem limites para o que podem engolir.

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